Intelectual funcional

Adoro essa expressão que li hoje no jornal: analfabeto funcional. Ela revela tanto sobre nosso sistema de ensino, acho que nem preciso explicar, né? Um termo um pouco técnico, estilo “colateral damage”, ao invés de dizer a verdade nua e crua. Guerra mata. A escola não ensina. Tem também o intelectual funcional, que é o cara que acumula uma porção de títulos mas que nunca parou um segundo na vida para pensar.

Pois pensar é difícil.

Veja essa pequena história: tive que dar uma aula concentrada, pois à noite, por problemas de divulgação e sala de aula, os alunos chegaram na terceira semana. Então mostrei o Moodle, falei do curso sobre memória, do trabalho, deixei eles no laboratório lendo o texto dificílimo do Krausz e voltei para a sala, com a seguinte recomendação: “Não voltem direto depois de ler o texto; caminhem com calma, pensando sobre a memória.”

Na sala, pouco esperei e lá voltavam eles, sentados, ávidos para debater. “Já?!? Mas vocês voltaram devagar? Não? Então fiquem lá fora, olhando o jardim, pensando na memória, por 5 minutos.”

Esses momentos de espera para mim são um tédio. Mas são necessários. Então, no relógio, quando deu 5 minutos os chamei de volta. “E então?”, perguntei. Um aluno disse: “Achei muito difícil isso.”

O Moodle? O texto de Krausz? A proposta do trabalho? “O texto de Krausz?”, eu perguntei.

“Não, ficar cinco minutos pensando sobre o que é memória. O que é memória?”

Me surpreendi. Mas é isso mesmo. Difícil é pensar. Espero estar fazendo minha humilde parte na redução do número de intelectuais funcionais no grupo dos futuros professores da nação.

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