Um lugar para nossos caminhos

Nota sobre a cerimônia que marca o início das obras do Museu Judaico de São Paulo.

Valeu a pena ter ido! Comecei com a sensação de que amo o povo judeu como os comunistas amam o povo: mais pelo conceito do que pelas pessoas em si. E saí com uma certa dúvida… Talvez eu goste das pessoas também.

Chegar lá, ver os rich and famous da comunidade, te cumprimentando assim de soslaio, buscando em torno gente mais importante que você. Do I belong here? Só porque meus bisavós compraram os móveis e tapetes da sinagoga, é pra eu estar aqui? Ainda bem que fui com a Marlene, mais dentro-e-fora da comunidade que eu.

Médicos que trataram ou enterraram alguns familiares, professores da USP, o Sobel cujos discursos, vamos combinar, sempre fazem falta, líderes comunitarios, uns rabinos – como é difícil ser rabino numa sociedade laica! Como o que dizem é constrangedor, fora de tom! Quando sobe um no palco eu já “brace for impact”. Não os culpo. Sociologia 101: líderes políticos são eleitos, os médicos cuidam do corpo, os professores cuidam do saber, os livros de auto-ajuda da vida, o Prozac da alma, o que exatamente resta para os rabinos?

E também as autoridades, adorei as falas, gostei mesmo. Elegantíssimo Andrea Matarazzo, desajeitado prefeito, articulado Floriano Pesaro. O melhor discurso foi do vereador. Falando do ponto de vista da cidade, devia ter anotado os principais pontos, que ficaram embaralhados pois todos se assemelhavam no tom comemorativo.

O prefeito disse que falava em nome de milhões de paulistanos, agradecendo o que os judeus fizeram pela cidade. Matarazzo, se não me engano, falou do Museu como ponto articulador da presença judaica em São Paulo, destacando o Einstein entre os marcos principais. Pesaro também, se não me engano, destacou a nossa contribuição para a cidade. Eu os agradeci depois, na Avanhandava, e quem sabe ainda voto em algum.

Alguns colocaram a presença judaica no Brasil já desde o descobrimento, o que é uma narrativa nova, provavelmente correta. Estamos há mais de 500 anos no Brasil. Desde aqueles primeiros colonizadores, passando pelos marroquinos amazônicos, os askenazi que construíram o Bet El e por fim os egípcios da era Nasser, todos foram lembrados e serão lembrados no museu.

Estava lá a Nancy Rozenchan, a quem vejo também nas festas judaicas, e que está trabalhando na parte histórica propriamente dita do museu. Encontrei uma conhecida com quem eu tinha passado um shabat engraçado em Ubatuba, no final do ano. E uma Anita, uma mulher muito fina, o que convenhamos é uma certa raridade entre nós. Alguém me perguntou se eu era prima de alguém.

E depois ainda teve um gostoso almoço com a Marlene, para falarmos de nossos valores, famílias, fofocas e filosofias.

Então, valeu. Amar, não nos amamos. Mas estamos juntos no barco, carregando uma história comum que é pesada mas que por uma razão ou outra decidimos não soltar ao mar. Por isso é bom estar junto, e é bom que tenhamos um lugar para colocar nossas memórias, nossos caminhos cruzados, nossos encontros e perdas.

Parabéns aos que idealizaram o museu e que o estão construindo, e especialmente obrigada aos mais de 100 funcionários públicos cujas assinaturas, ao longo de 10 anos, foram imprescindíveis para o começo das obras!

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