Já devo ter contado essa. No terceiro ano do Bandeirantes, eu fazia a “347”. As turmas tinham números. Como eu havia abominado a “246”, puxei as notas pra baixo para cair em uma turma menos silenciosa e vestibulenta. Foi menos ruim mesmo. Aí nas últimas semanas o Ernesto perguntou:
– Dado tudo o que foi, quem aqui não teria feito o Bandeirantes?
Pra mim, a pergunta era das fáceis. Displicente, levantei a mão achando que boa metade da turma faria o mesmo. As meninas – 247 era a segunda melhor turma feminina de biológicas – todas olharam para mim com seus braços abaixados, e eu fui puxando o meu aos poucos, como quem cometeu uma gafe.
O que eu não gostava? Não eram os professores. Como não gostar da Márcia Kupstas? Do professor de atomística que me deixava faltar por causa da natação? Do próprio Ernesto, coelhinho, se eu fosse como tu. Do Nasser de história que me olhava como se meu esporte fosse fazer tiro ao alvo nos seus?
Eu não tinha nada contra ninguém. Também não aprendi nada com ninguém, é verdade, a não ser com os professores de literatura brasileira, cujas aulas me encantaram. Augusto dos Anjos. O colegial foi um intervalo no meu aprender. No Pequeno Príncipe aprendi, na FEA também.
E os colegas, que até hoje são meus amigos do peito, os que foram para a FEA, a Andrea, outros que eu encontro nos Estados Unidos, ou ouço falar. Bandeirantes. Eu gostava dos colegas. Por onde anda a Chris? E depois a Coelha, a Maria Lúcia, a Cainha, o Zigoto. Reencontro de leve no Face.
Não tinha um professor de laboratório loiro, muito bonito? E um sujeito amargo, não sei de que matéria, que tomava o metrô e dizia que nunca antes o povo no metrô andava tão amargo, e hoje me dou conta que naquela época não havia o metrô de antigamente.
E não tinha um outro professor de laboratório, de traços orientais, moreno, de óculos? E uma professora de biologia que do nada falava de sexo? Não havia o que não gostar naquelas pessoas. Não foi o Arnaldo de história que encontrei recentemente no Ponto Chic?
E não teve também um jornalzinho de um Eiji para quem entrevistamos o Antônio Fagundes? A luta para aparecer no Composição?
Eu não suportava as paredes do colégio. Eu sentia o ar apertado por conta das paredes. Aí vieram as câmeras e não melhorou. As paredes fabris do Bandeirantes. O conhecimento desprazeirado. Não havia nada de errado com o lugar além do fato de nos encontrarmos todos lá.
Difícil entrar na sala da 246 toda manhã, o silêncio, a matéria na cadência “cai no vestibular”, “não cai no vestibular”. Aí eu levantava a mão, o professor respondia que não cai no vestibular e as colegas me olhavam feio por estar lhes roubando o precioso tempo do vestibular.
Ontem o Hubert, entre todos os seres do planeta, pergunta à platéia: alguém aqui fez Bandeirantes? Mas já se passaram quase 30 anos, o quê, sou besta? Uns e outros levantaram a mão. Eu fiquei estática, nem respirei. Relaxei quando tudo passou. Não, eu não fiz Bandeirantes.