A tentativa de criar um grupo de judeus liberais me inspirou a escrever esse pequeno texto, que compartilho com vocês.
Eu gostei muito de ter ido na pizzaria e conhecido o Isaac e os outros membros do grupo. O Isaac me perguntou qual deveria ser, na minha opinião, o papel do grupo. Vou tentar aqui dizer o que eu busco hoje quando vou no Beth-El, quando vou no encontro do Judeus Progressistas, quando proponho uma universidade judaica online para a Conib.
Penso que hoje, por um lado, há tendências obscurantistas ou nacionalistas no judaísmo, o que nos incomoda muito. Mas, por outro, há uma riqueza enorme de visões da religião, de modos de ver o judaísmo, assim como mil oportunidades de criar um judaísmo rico em diálogo com outras culturas. Eu acho que deveríamos explorar essas riquezas e oportunidades.
No Brasil, há hoje uma enorme curiosidade pelo judaísmo, e a verdade é que muitas vezes nem nós conhecemos tudo o que ele oferece, como se nossa tradição fosse monopólio de judeus ortodoxos. Então em primeiro lugar gostaria de um ser parte de um grupo que valorizasse esse conhecimento, essas tradições, que os tornassem vivas, e que visse essas tradições como parte de um conhecimento global que pode interessar a todos, judeus ou não.
No plano político, que pelo que entendi é a pegada do Judeus Progressistas, eu gostaria de ser parte de um grupo liberal. Ou seja, que defendesse questões tais como direitos individuais, direitos de expressão, igualdade e respeito às diferenças. Somos americanos, seja norte americanos ou latino-americanos. A nossa experiência é a de cidadania territorial, religião separada do Estado, direito “à busca da felicidade”. É por aí que pensamos, não?
Então acho que devemos lutar, seja no Brasil, nos EUA, em Israel ou nos países árabes – e cada vez mais as lutas são globais – pelo direito das mulheres, dos homossexuais, pela proteção aos jornalistas, pela liberdade religiosa plena (que incluir a liberdade de ser ateu, obviamente), e assim por diante. Devemos lutar pela transparência governamental. Por coisas que nos unem, que farão países melhores para judeus e não-judeus viverem. Que possibilitarão que judeus contribuam mais com seus países e que possam neles construir um judaísmo ainda mais rico.
Cultura judaica para todos e liberalismo. Acho que essas são minhas bandeiras.
Não é minha bandeira pedir desculpas pelo que faz o governo israelense. Não é. Claro que não gosto de tudo, claro que acho uma tremenda besteira financiar assentamentos que só dragam os recursos para fazer de Israel uma sociedade mais segura, mais justa, mais pujante. Detesto ler os relatos de discriminação aos árabes israelenses e torço para que um dia toda a população deste país sinta orgulho de ser israelense, assim como torço para que um dia os índios brasileiros não se sintam estrangeiros em sua própria terra.
Entretanto, sabemos que as escolhas que os israelenses fazem – a construção do muro, por exemplo – têm ampla base na realidade hostil que vivenciam. Penso que atacar políticas com as quais não concordamos deve ser algo meio natural, como questionaríamos a política externa americana, a xenofobia européia, a restrição à liberdade de imprensa em Cuba ou na Venezuela. Mas meu grupo ideal não faria disso uma prioridade. A prioridade seria encontrar bandeiras comuns a todos nós, sejam brasileiros, israelenses, árabes, americanos.
Então, é isso: queria fazer parte de um grupo com bandeiras que atraíssem especialmente os jovens, judeus ou não, que quisessem resgatar nosso judaísmo ancestral, aprender com ele e atualizar esse corpo de conhecimento e experiência para os dias de hoje. Que se mobilizassem em torno de bandeiras comuns inspiradas no valor à vida, à liberdade e ao diálogo do qual dependemos todos!
Cara Heloisa
Bem interessante suas colocações sobre o judaísmo. É a primeira vez que leio idéias sobre o judaísmo diretamente na fonte.
Este grupo que se está em criação (creio eu), os Judeus Progressistas, pode dar uma contribuição importante para o entendimento da cultura judaica em nosso país se caminhar na estrada sugerida por voc^de neste post.
abs
JRCardoso
Oi Cardoso,
Fico feliz com seu comentário! Acredito que no geral as organizações judaicas e os judeus, em suas profissões, pensem mais ou menos de acordo com o que escrevi, pois é parte de nossa cultura, de um modo ou outro, criar coisas e colocá-las a disposição da comunidade como um todo. Sobre esse grupo em especial ou sobre iniciativas recentes de algumas organizações, aí eu já não sei. Pois aí entram ideologias e práticas outras, como por exemplo o nacionalismo (e seu contrário, um pacifismo meio sem noção) e o marketing (como se o judaísmo pudesse – ou precisasse – ser embalado para venda). Então no atacado eu sou otimista, mas no varejo não sei muito bem para onde vamos. Lancei a idéia, tenho lançado em outros fóruns, vamos ver!
Abraços!
Heloisa
Bom ouvir sua voz, Heloísa. Porque acho que o que você diz bate com o que a maioria dos judeus modernos – religiosos, não religiosos, interessados, ocupados, liberais, progressistas, humanistas, … – enfim, a maioria dos judeus pensa. Mas não pratica nem expõe nem defende. O que deixa o campo aberto a extremismos que se colocam como os legítimos representantes dos judeus. Entre eles, os ultra-ortodoxos. E os ultras em geral.
Puxa, você resumiu esse quadro geral de um modo que eu não tinha visto. De fato, o que eu falei é um pouco o óbvio, a tal silent majority. Mas as organizações tem desejos próprios, seja a favor disso, ou contra aqui, que muitas vezes se deslocam dos interesses mais gerais e cotidianos…
Heloísa, posso colocar um link a este seu post no meu blog? http://gcoen.blogspot.com.br/
Claro, nem precisaria pedir.