E dentro do ônibus me bateu uma bruta melancolia. Um semestre mais perto do fim do livro, dois cursos dados a mais.
Uma mulher de sandálias rasteirinha e roupas estilo Vila Madalena atravessa solitária aquele cebolão central, indo da Consolação à Dr. Arnaldo, suspensa acima de tuneis. Anda com passos firmes mas femininos na calçada estreita. Eu penso no semestre que foi.
Nas duas últimas reuniões que participei, espécie de castigo, de prova final até chegar à Terra Prometida, que aguentei sem muito estoicismo, disse o que penso sem forças para me censurar.
E depois desabei de vez, mais um semestre. Uma aluna me diz que salvei sua vida; outro não me cumprimenta no corredor. Para uns dou uma chance, outros a desprezam e ficam com 6,0 mesmo. Ensinei muito, pois foram dois cursos distintos. Ensinei sobre os Estados Unidos, esse país grande e genial. Mas foi fácil ensinar; o país se escreve, se conta. Quando obtiver tenure vou ensinar sobre o povo judeu, que também se conta. Mas não será fácil.
Ensinei sobre São Paulo, não foi tão fácil. Aprenderam? São Paulo tão à mão. Como disse o pastor em frente ao Teatro Municipal, numa lógica impenetrável: “Jerusalém! São Paulo! Jerusalém. São Paulo. Eu tenho dito: tão próximas. Mas não querem ver.” Fiquei o ouvindo, adiando a reunião, mas não entendi a lógica, Jerusalém, São Paulo. E eu falei: “Marília! São Paulo!” E alguém respondeu: “Aleluia!”? Ainda falta um trabalho sobre o Bexiga.
Mas os cursos já estão no final, já estão acabando. E cumpri a missão, mais dois cursos, a sensação de ter dito tanto e de ainda se ter tanto o que dizer. De ter ensinado tanto e tão pouco. “Não salvei sua vida; apenas estudo uma área que não se estuda aqui, e na qual você tem interesse.” Também queria dizer aos outros: “não perca tempo me detestando, não vale a pena.” Pois as batalhas serão tantas tantas, economize as forças, os elogios, as críticas, menos, menos, menos. É só um semestre que acabou.
Crônicas da Sala de Aula 