Tel Aviv, dia 26

Bom, hoje o blog acaba. Vou falar rapidinho do que fiz e passar para as conclusões. Algo mais elaborado eu vou escrever em agosto. Só recapitulando, chego no domingo de manhã no Brasil. Que delícia! Esses risquinhos já estão me dando nos nervos; outro dia sonhei que olhava um mapa e todas as ruas estavam em hebraico, com duas exceções: a Rua Rio de Janeiro e a Rua Manaus. Vá entender os sonhos. Hoje vi a Rua Brasil, de verdade, com “s”, perto da universidade. E a Rua Salvador, também perto da universidade.

Estava na universidade para ver uma professora de Haifa, que trabalha com questões de imigração, percepções que as pessoas têm dos imigrantes, oportunidades de emprego, etc. Ela explicou: aqui cidadania e nacionalidade são coisas separadas. Você é parte de uma nação, mas tem outra cidadania. E aqui as pessoas falam mesmo o que pensam dos outros grupos étnicos! Isso eu já tinha percebido, com algum pudor. Meu último compromisso acadêmico. Antes só li o jornal, vi uma exposição no pavilhão Helena Rubinstein, coisas contemporâneas, fotos, sexualidade, coisas urbanas, modernas, iguais em todo mundo. Um artista me impressionou muito. Os rostos todos com a mesma expressão, difícil de descrever, séria, dura, me causou impacto. Retratos de gente diferente, todos jovens, duros, cansados. Um rapaz atrás de folhas de seringueira, sei lá como. E um outro artista fazendo algo bem gozado, retratos de senhoras da Wizo de Melbourne. Depois a professora, e depois cinema iraniano no shopping. Filme pesado, vocês viram? Sobre o grupo de rock? Ai, que coisa doída. Não esperava. Tinha legendas em inglês e hebraico. Filme moderno, música excelente, até o Rap era bem legal. Cenas de Teerã. Me despedi de meu amigo do futebol. Na rua, passou uma troupe de patins, ocupando a avenida. Cidade moderna. Amanhã vou para uma cidade tecnológica, com uns museus interessantes. Chega de sociologia, de história, de conflitos e etnias. Chega de gente. Vou embarcar nessa, artes plásticas, tecnologia, abstrações.

Acho que o wrap up fica pra amanhã…

Isso, ficou para hoje. Então o que vi? Bem, em primeiro lugar, vim para ver o Israel de verdade, cotidiano. Além das notícias nos jornais. O dia-a-dia, o país. E vi. Vi pois o país se abriu, se escancarou. As casas se abriram, as pessoas, as ruas. Foi bom ter vindo no verão, apesar do sol escaldante. Não é mais quente, ou mais equatorial que São Paulo. Mas não chove, não refresca, não sombreia. E então o que vi?

Uma cidade normal, onde os aposentados vão a prefeitura reclamar das contas de água e se embrenham na burocracia de secretárias ávidas por um drama. Mas também uma cidade onde os adultos se preocupam com um ataque nuclear do Irã. “Não, não vai acontecer. Mesmo que eles obtenham a bomba, não vão soltar. Ou vão.” Onde as meninas andam de shortinhos curtos e chinelos nas ruas. Onde os jovens deixam o computador na mesa do café quando vão ao banheiro, e a carteira na cadeira de praia quando vão nadar. Onde as mães escutam o rádio com apreensão, por seus filhos ou dos outros. Onde os soldados falam de coisas de vida e morte de um jeito banal, como se tudo isso estivesse integrado para eles, não houvesse contradição, vida normal, guerra, vida normal, guerra. Onde todo mundo é igual, mas há tantas diferenças por debaixo dessa igualdade que você começa a se posicionar diante delas, a se imaginar na hierarquia. Então enfim o normal e o anormal, o estado de expectativa, de atenção, de alerta, são as duas partes do país. Ah, eles dizem, e vocês no Brasil, os crimes, o medo do assalto, os muros, a violência. Sim, nossa violência. O trânsito que mata. A cidade de Deus. Outra coisa. Mesma coisa?

E a doçura de estar entre os seus. Entendo por que tem gente que não agüenta, vai embora, quer ser anônimo, quer ser indivíduo. Mas entendo a doçura também, o sentimento de familiaridade, mesmo dentro dessa certa rusticidade. A doçura de estar no próprio clã. Pra mim, essa doçura três vezes por semana na Hebraica, tá de bom tamanho. Eu não iria pra guerra por ela. Mas entendo quem vá. Bom momento para acabar, pois a máquina de lavar dá o último spin. Até domingo! Lehitraot!

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3 respostas em “Tel Aviv, dia 26

  1. Nossa, e eu que achei que essa comparação era a maior bobagem! Mas é como me senti. Uma diferença é que rir é propriedade dos judeus da diáspora, o pessoal aqui não ri, não gargalha.

  2. Uma outra polaridade, pra ir junto com o antepenúltimo parágrafo: Um país que tem os melhores cientistas, músicos, até arquitetos. Mas que inventou algo único: uma cultura judaica de massa, com direito a programa de auditório, música ruim e notícias sensacionalistas.

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