Jerusalem, dia 21

Acordei cedo, vi que havia algum problema com o gmail mas decidi deixar para depois; quem sabe o gmail estava inoperante ou algo assim. Fui para Jerusalém; à tarde havia uma palestra do centro de estudos latino-americanos, e queria ver como era.

De manhã, passei pelos prédios públicos, Knesset, Ministério de Foreign Affairs, sol já forte às 9 da manhã. O museu de Israel estava em reformas, pouca coisa para ver. Mas adorei uma pequena exposição sobre janelas. Tema gozado, né? Mas fazia sentido. Janelas na bíblia, mulheres e janelas, pintura européia com janelas. Adorei um video chamada wondering home, vi duas vezes seguidas. Simples, mas efetivo. Uma sala com alguns móveis e ao fundo uma paisagem que se move como se a casa fosse um trem. paisagens locais, army posts, camelos, árvores, cidades. Dentro, muda pouco. Os móveis vão desaparecendo, um pano cobre o sofá. Câmera fixa na sala. Wondering home.

Como fiquei pouco tempo no museu, resolvi passar pela cidade velha, ver a burnt house que eu não tinha visto. Não gostei. A casa em si é impressionante, uma casa incendiada pelos romanos. Mas o vídeo que dirigia a visita, escurecendo a sala, era tão ideológico que não dava. Uma coisa meio realismo socialista, sei lá. Completamente inapropriado. Falando das razões da revolta. Fugi mais uma vez da cidade velha, pela porta, olhando para o muro, da direita, onde há escavações novas, tirei fotos.

Uma da tarde, calor já insuportável. Aí tomei um táxi que valeu o dia. Puxei conversa sobre Jerusalem, ele disse que adorava, pois é um lugar sagrado. Sagrado demais, eu respondi. Para mim que não acredito em Deus, não gosto não. Ah, foi a deixa. Ele passou o resto do tempo tentando me converter ao Islã. Explicou por que o homem não pode viver sem regras, especialmente regras sexuais. “O que as pessoas fazem em Tel-Aviv não é certo.” A imagem de Tel Aviv como um antro de perdição, já tinha ouvido isso antes. E depois, há a vida depois da morte. Ele queria me converter para o meu próprio bem, pois eu iria passar mal se não seguisse o judaismo, o cristianismo, e finalmente o islamismo que é a forma mais perfeita. Eu deveria ler o Alcorão. Com uma convicção, com um carinho tudo isso. Com um sentimento de missão, mas não missão ideológica, hostil. Carinhosa, “estou falando com você como se você fosse minha irmã.”

Mas gente como eu não pula de homem em homem, eu disse, olha onde você está me trazendo, eu pulo de livro em livro. “É verdade”, ele concedeu, “isso me faz falta, eu queria ter estudado também. Eu errei.” Pode ser ingenuidade minha, mas melhor instrução para a galera aqui ia ajudar bastante. Para os judeus israelenses, para os árabes israelenses, para os árabes palestinos, jerusalemitas. Pois o rapaz queria falar, queria discutir, queria me convencer, queria responder meus argumentos. Me disseram que dentro de suas comunidades não tem muito espaço para isso não… um cara desses na minha aula… eu ia botar-lhe umas boas interrogações na cabeça.

Depois a palestra da brasileira, e depois de uma argentina, legal mas nada especial. Aí conversei com o professor argentino de novo, ele também havia gostado da última conversa. Falamos dos israelenses, dessa mentalidade de clã. E do jeito pouco reflexivo, tão diferente dos judeus da diáspora, Ação primeiro. Veja essa coisa da flotilla, eles vão lá, agem, e depois xi, matamos 9 pessoas! E agora? Eu ri. Com os estrangeiros é que eu rio. Essa coisa que aprendemos a associar aos judeus, esse rir das contradições, das tragédias, dos desacertos, acho que não é muito sionista não.

Aí me virei com os emails, voltei para Tel Aviv, conversando no ônibus com um estudante de direito muito simpático. Sugeri que ele lesse Memórias de um Sargento de Milícias. E o longo dia acabou.

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