Tel Aviv, dia 19

Acordei no meio da tarde, pois dizem que aqui os judeus podem se sentir à vontade, e não há nada mais à vontade do que dormir no meio do dia, e pensei: o que fiz até hoje? Tudo estava meio nebuloso, onde eu havia passado as útlimas semanas? Pois para realmente entender aquela cena do relógio do Morangos Silvestre precisa ter 40 anos, para sentir acho que precisa ter 70. Pensei: ainda bem que mantive o blog, pois está tudo registrado. E que não estiver eu lembro lendo. Aí a primeira coisa que me veio à cabeça foi a moça da galeria, pela manhã, me contando quando saiu da aula de hebraico e de repente os letreiros faziam sentido, e ela se sentiu parte daquilo, pois podia ler. A partir daí fui lembrando, a ativista americana, o moço do avião, a amiga em Haifa. Lembrei das suas frases, do que haviam dito. Aqui as pessoas não perdem tempo com papo chiclete, falam as coisas que vão ao âmago, então lembrei do que haviam dito. Do que haviam dito sobre mim, especialmente.

E me vesti direito, até me arrumei, desci até um tal de Gordo, acho que uma brincadeira com a rua Gordon, ou eu é que não vi o “N”. E li. Li sobre um dos pioneiros da literatura hebraica, um texto maravilhoso. Que responde algumas dúvidas minhas dos últimos dias, mais ou menos a seguinte: não é muita ideologia? Não é muito nacionalismo? Não é muita pressão para ser igual aos outros? Bom, é um pouco essa sociedade que está em crise, imigrantes, trabalhadores, religiosos, individualismo, consumismo, etc., etc. Mesmo assim, você sente isso, especialmente na geração mais velha. “A gente perdeu o país.” Para uns se americanizou (eu acho isso ótimo, mas entendo a crítica), para outros os religiosos tomaram conta. Vi um desses sionistas ligado à atividade física, natureza, imitando os judeus rezado, mexendo para frente e para trás, muito gozado!

O autor escreve nos anos 30, 40, 50. E traz, segundo a intro, exatamente esse dilema: seu herói não encontra espaço para si nessa sociedade de gente ativa, decidida, otimista, confiante. Engraçado que eu ia lendo a intro e já ia adivinhando onde ia dar, como se houvesse uma lógica, uma tensão mais ou menos universal. Então a uma certa altura já esperava: Quando o autor envelheceu, voltou a escrever, e disse que se deu conta tardiamente que seu sentimento de isolamento no grupo na verdade era mais a regra que a exceção. Todos querendo “fit in” num grupo imaginário…

Então me alimentei. Nem história nem literatura. História da literatura, um jeito de entender o país. Não comi coisa árabe pois, como disse, já está saindo terrina pela orelha. Comi um ceviche de frente para o mar, o sol se pondo devagar, entre os coqueiros, indo para o Oeste, indo para aí. E à noite caminhei na praia, areia fresca, mar morno. Yaffo lá longe, ao sul. Na costa, hotéis com luminosos.

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