Então vamos lá, véspera de Natal.
Do Natal não posso falar mal, pois foi com uma história de Natal que publiquei meu primeiro conto, no Estadão, em 1978 ou algo assim. Lendo os poemas da minha sobrinha no Wikispaces percebo como evoluí enquanto escritora nesses 30 anos. A história era simples, e começava assim: “Sou judia.” Mas esse fato não impedia que o Papai Noel salvasse um barco à deriva num trenó aquático puxado por golfinhos. Bem infantil, mas funcionou para o editor, e é isso o que importa.
Depois tinha os enfeites de árvore de Natal que a tia Maria Luíza me dava a cada ano, para que eu fizesse a minha árvore. Eu ia lá na casa do Jardim Paulistano e passava o dia ajudando a montar a árvore grande e verde. O que sobrasse era meu. Uma senhora tia, a tia Maria Luíza, mulher do tio Jaime, o que me perguntou onde era, afinal, que ficava Israel. Bom, eu respondi, lá no fundo do Mediterrâneo. Minha árvore tinha uma bonita estrela de Davi prateada no topo, meu pai achou o máximo.
Um pouco depois resgatei a árvore já esquecida no armário e fizemos um Natal do pessoal da natação do clube aqui em casa. O clube é a Hebraica, veja post anterior, mas tinha muitos “militantes”, atletas que não eram sócios mas treinavam pelo clube, então valia um Natal. “Eles comeram todo o estrogonofe”, minha mãe, que sempre fazia comida para sobrar, repetiu chocada durante semanas. “Tive que esconder um prato para o Vitão.” Vitão era o nosso técnico. Nadador come muito.
No ano passado, na véspera de Natal, fomos na casa de um amigo do Mick, lá naqueles prédios de NYU, que é casado com uma francesa católica. Muito gostoso. O filho deles tem um levíssimo autismo, o suficiente para o colocar numa das melhores escolas de Nova York e contar histórias sem fim. Os pais o cortavam, pois achavam que incomodava, mas eu queria era ouvir mais.
E no almoço de Natal fiquei na casa do Mick e da Naomi fazendo vatapá. Claro que calculei mal o tempo e botei a Naomi para ajudar na salada e coisa e tal. Mas aí foram chegando todos, Felipe e Susanna, as meninas, amigas da Susanna, tios hippies da Susanna, e todos comemos juntos um bonito vatapá de Natal.
Ainda tínhamos juntos mais vários dias em NY, eu vinda de Pittsburgh e eles de Boston. Então fomos ao Metropolitan Museum, que eu não amo de paixão mas reconheço que tem muita coisa. A uma certa altura os pais disseram: vamos ver se tem passeios dirigidos. Não gosto de passeios dirigidos mas fui. Aí eles não gostaram das opções e foram embora; eu fiquei com as meninas, que podia escolher entre o passeio do Natal e um outro, sobre mitos antigos.
Escolheram o do Natal. Mas Natal?, eu perguntei. Natal, elas disseram. A guia era longilínea como são as novaiorquinas, tinha os cabelos longos, grisalhos, e gostava do museu. Nos dias seguintes a víamos andando na Quinta Avenida, nessa pequena metrópole que é NY. Ela contou a história de Natal como uma narrativa ancestral, de um menino que recebe presentes preciosos ao nascer, em quem são depositadas mil esperanças. Então me envolvi. Foi mostrando quadros, pedindo desenhos às crianças, falando dessa outra criança.
Gostaram?, eu perguntei no final. Gostamos. Gostaram mesmo?, eu insisti, ainda achando estranho. Por quê? Ah, elas me responderam, é que não conhecíamos a história. Como assim, não conheciam? Na escola não contam? Na escola nem pensar, elas disseram. As professoras não podem. E em casa? Em casa também não falam do Natal.
Então está aí, minha história de Natal.
A freylekh nitel alemen!
a gute yomtov, sein gesint!